28 de julho de 2014

António Botto: Andava a lua nos céus


Andava a lua nos céus
Com o seu bando de estrelas

Na minha alcova
Ardiam velas
Em candelabros de bronze.

Pelo chão em desalinho
Os veludos pareciam
Ondas de sangue e ondas de vinho.

Ele, olhava-me cismando;
E eu,
Placidamente, fumava,
Vendo a lua branca e nua
Que pelos céus caminhava.

Aproximou-se; e em delírio
Procurou avidamente
E avidamente beijou
A minha boca de cravo
Que a beijar se recusou.

Arrastou-me para Ele,
E encostado ao meu ombro
Falou-me de um pagem loiro
Que morrera de saudade
À beira-mar, a cantar...

Olhei o céu!

Agora a lua fugia,
Entre nuvens que tornavam
A linda noite sombria.

Deram-se as bocas num beijo,
─ Um beijo nervoso e lento...
O homem cede ao desejo
Como a nuvem cede ao vento.

Vinha longe a madrugada.

Por fim,
Largando esse corpo
Que adormecera cansado
E que eu beijara, loucamente,
Sem sentir, ─
Bebia vinho, perdidamente,
Bebia vinho..., até cair.


António Botto
Portugal (Concavada, Abrantes) 1897
Brasil (Rio de Janeiro) 1959
in Canções e outros poemas
Editor: Edições  Quasi
photo by Google

Sem comentários:

Enviar um comentário