
Se a nossa vida fosse um eterno estar-à-janela, se assim ficássemos,
como um fumo parado, sempre, tendo sempre o mesmo momento de crepúsculo
dolorindo a sombra dos montes. Se assim ficássemos para além de sempre!
Se ao menos, aquém da impossibilidade, assim pudessemos quedar-nos,
sem que cometêssemos uma acção, sem que os nossos lábios pálidos
pecassem mais palavras!
Olha como vai escurecendo!... O sossego positivo de tudo enche-me de
raiva, de qualquer coisa que é o travo no sabor da aspiração.
Dói-me a alma...
Um traço lento de fumo erge-se e dispersa-se lá longe... Um tédio
inquieto fas-me não pensar mais em ti...
Tão supérfluo tudo! nós e o momento e o mistério de tudo.
Fernando Pessoa
(Portugal 1888-1935)
in Livro do Desassossego
"Assirio & Alvim"
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