Diz Ele:
Amada, és única, de ti não se fez duplicado,
Com mais encanto do que todas as mulheres,
luminosa, perfeita,
Uma estrela que desce sobre o horizonte pelo
novo ano,
um bom ano,
Esplêndida nas cores que traz
e de sedução a cada olhar.
Os seus lábios são encantamento,
o seu pescoço tem o tamanho certo
e os seios uma maravilha;
O seu cabelo lápis-lazúli a brilhar,
os seus braços de mais esplendor que o oiro.
Os seus dedos fazem-me ver pétalas,
as do lótus são assim.
As suas ancas foram modeladas como deve ser,
as suas pernas acima de outra beleza
qualquer.
Nobre a forma como anda
(vera incesso)
Meu coração seu escravo ficaria se a mim se
abrisse.
As cabeças voltam-se – por culpa sua –
para a seguirem com o olhar.
Afortunado o que a puder abraçar plenamente;
será o número um entre todos os jovens
amantes.
Deo mi par esse
Todo o olhar a vai seguindo
mesmo quando já desapareceu fora do alcance
Singular deusa,
sem igual.
Diz Ela:
A sua voz perturba o meu coração,
Por sua culpa é que eu sofro.
O vizinho de minha mãe!
Mas não posso vê-lo,
Porque terá ela de me irritar?
Mãe:
Oh, para de falar nesse indivíduo,
só de pensar nele fico revoltada.
Ela:
Sinto-me aprisionada porque o amo.
Mãe:
Mas não passa de um miúdo, nada tem na
cabeça.
Ela:
É como eu, eu também sou assim
e nem ele sabe como desejo enlaça-lo num
abraço.
ISSO sim, havia de pôr minha mãe a falar…
Pudesse a deusa de oiro decidir
fazer dele o meu destino.
Vem para onde te possa ver.
Meu pai e minha mãe hão-de ficar contentes
Porque toda a gente diz bem de ti
E também eles hão-de vir a dizer.
Diz Ela:
Quis sair e vir a este sítio tão bonito
para descansar um pouco,
Mas lá vem o Mehy na sua carruagem
com mais uns quantos jovens,
Como evitá-los?
Poderei passar por ele
como
se nada fosse?
Oh, o rio é a única saída
mas não sei andar sobre a água.
A confusão que vai na minha alma.
Ao passar por ele revelaria o meu segredo,
diria a verdade dos meus segredos; diria:
Sou tua!
E ele havia de pronunciar o meu nome e
passar-me a cada um dos que quisessem
somente passar um bom bocado.
Diz Ela:
O meu coração rebenta quando penso em como o
amo,
Não sou capaz de me comportar como outra
pessoa qualquer.
Ele, o coração, está em desordem
Não me deixa escolher um vestido
ou esconder-me atrás de um leque.
Não consigo pôr pintura nos olhos
nem optar por um perfume.
«Não pares, entra dentro da casa.»
Foi o que disse o coração uma vez,
E ainda diz sempre que penso no amado.
Não me faças fazer figuras, coração meu.
Por que és tão idiota?
Aquieta-te! Mantém-te calmo
e ele há-de vir ter contigo.
A minha cautela não permitirá que as pessoas
digam:
A rapariga está perturbada de amor.
Quando te lembrares dele
sê firme e forte,
não me abandones.
Diz Ele:
Adoro a Deusa que brilha como o oiro,
Hathor, a poderosa,
e eu louvo-a.
Exalto a Senhora dos Céus,
dou graças à Padroeira.
Ela ouviu-me a invocá-la
e pôs no meu destino a minha amada,
a que veio por sua vontade procurar-me.
A felicidade que com ela chegou!
Levanto-me exultando
de alegria
e de jubilo enquanto digo:
Ora
Observai.
Vede bem!
Os rapazes deitam-se-lhe aos pés.
O amor respira dentro deles.
Presto homenagem à minha deusa,
porque me deu, só a mim, esta rapariga.
Desde há três dias eu oro,
pronunciando o seu nome.
Por cinco dias me deixou.
Diz Ela:
Fui a sua casa, a porta estava aberta.
O meu amado estava ao lado da mãe
com irmãos e irmãs à volta.
Toda a gente que passa sente simpatia por
ele,
um excelente rapaz, não há nenhum como ele,
um amigo de raras qualidades.
Olhou para mim quando eu passei
e o meu coração rejubilou.
Se a minha mãe soubesse em que estou a pensar
havia de ir logo falar com ele.
Ó Deusa da luz de Oiro,
faz com que lhe chegue esse pensamento,
Então poderia visitá-lo
E pôr-lhe os braços à volta à vista das outras
pessoas
E sem chorar por causa da multidão,
Mas contente por saberem
e por tu saberes de mim.
As homenagens que eu não prestaria à minha
Deusa,
O meu coração revolta-se de pensar em partir,
Pudesse eu ver o meu amor esta noite.
Diz Ele:
Ontem. Sete dias e eu sem a ver.
A minha doença cresce;
pesados membros!
Já não me conheço.
O alto sacerdote não é medicina, o exorcismo
é inútil:
uma doença sem explicação.
Disse eu: Ela fará com que eu viva,
o seu nome fará com que me erga,
As suas mensagens são a vida do meu coração
chegando e partindo.
A minha amada é a melhor medicina,
mais do que qualquer farmacopeia.
A minha saúde está em vê-la aparecer,
Ficarei curado mal a
veja.
Abra ela os meus
olhos
e os meus membros
retomarão a vida;
Basta que fale e a
minha força voltará.
Abraçá-la fará
desaparecer a minha doença.
Sete dias e
ela abandonou-me.
Egipto 1567-1085 a.C.
Trad. Helder Moura Pereira
In Rosa do Mundo – 2001 poemas para o futuro
Editor: Assirio & Alvim
Photo by Google
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