A minha Lira tinha uma
corda:
Enquanto moço tanto
cantei,
Que a pobre corda
despedacei.
Agora, ás vezes, se a
Musa acorda,
E quer de novo pôr-se a
cantar,
Ninguém a corda pode
emendar.
Era uma corda que só
vibrava
Quando a minha alma
toda chorava,
E tantas mágoas,
tantas, cantei,
Que a pobre corda
despedacei.
O Amor e as penas da
Mocidade,
Quimera ou Sonho de
cada dia,
Eram os temas que ela
escolhia.
Porém um dia veio a
Saudade,
D'olhos vidrados e
humedecidos,
Poisar-lhe os dedos emagrecidos...
Então, vibrando, toda
chorosa,
Sob esses dedos,
brancos de cera,
Mais angustiada nunca
gemera!
E uma alma nova tão
dolorosa,
Com tanta mágoa nela
ressoa,
Que um ai supremo
despedaçou-a!
Desde esse instante,
nas minhas penas,
Sem essa corda que me
sustinha,
--Pobre Saudade! chora
sozinha...
Manhãs de estio, tardes
serenas,
Ocasos de oiro,
nocturno céu,
Para os meus olhos,
tudo morreu!
Mas a Saudade, no meu
tormento,
Geme e soluça com tanta
mágoa,
Que, a ouvi-la, os olhos
enchem-se d'água,
E sem um grito, sem um
lamento,
Minha alma vive na dor
que a enleia,
Como uma aranha na sua
teia...
A minha Lira tinha uma
corda:
Enquanto moço tanto
cantei,
Que a pobre corda
despedacei.
Agora, ás vezes, se a
Musa acorda,
E quer de novo pôr-se a
cantar,
Ninguém a corda pode
emendar...
A Mocidade não pensa em
nada,
E a pobre corda vi-a
quebrada
Quando tocava mais
afinada...
A Mocidade não pensa em
nada!
António Feijó
Portugal, Ponte de Lima
1859 – Suécia, Estocolmo 1917
in “ Sol de Inverno “
seguido de vinte poesias inéditas
Introd. Álvaro Manuel
Machado
Editor: Imprensa
Nacional-Casa da Moeda
photo by Google
Sem comentários:
Enviar um comentário