Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

14 de janeiro de 2012

Pablo Neruda: Corpo de mulher

Corpo de mulher,
brancas colinas,
coxas brancas, ancas,
assemelhas-te ao mundo no teu jeito de entrega.
O meu corpo de lavrador selvagem escava em ti
e faz saltar o filho do mais fundo da terra.


Fui só como um túnel.
De mim fugiam os pássaros,
e em mim a noite forçava a sua invasão poderosa.
Para sobreviver forjei-te como uma arma,
como uma flecha no meu arco,
como uma pedra na minha funda.


Mas desce a hora da vingança,
e eu amo-te.
Corpo de pele, de musgo,
de leite ávido e firme.
Ah, os copos do peito!
Ah, os olhos de ausência!
Ah, as rosas do púbis!
Ah, a tua voz lenta e triste!


Corpo de mulher minha, persistirei na tua graça.
Minha sede,
minha ânsia sem limite,
meu caminho indeciso!
Escuros regos onde a sede eterna continua,
e a fadiga continua,
e a dor infinita.

Pablo Neruda
(Chile 1904-1973)

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