Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

23 de agosto de 2015

António Botto: Não me peças mais canções

Se passares pelo adro
No dia do meu enterro,
Dize à terra que não coma
Os anéis do meu cabelo.

Já não digo que viesses
Cobrir de rosas meu rosto,
Ou que num choro dissesses
A qualquer do teu desgosto;

Nem te lembro que beijasses
Meu corpo delgado e belo,
Mas que sempre me guardasses
Os anéis do meu cabelo.

Não me peças mais canções
Porque a cantar vou sofrendo;
Sou como as velas do altar
Que dão luz e vão morrendo.

Se a minha voz conseguisse
Dissuadir essa frieza
E a tua boca sorrisse !
Mas sóbria por natureza

Não a posso renovar
E o brilho vai-se perdendo…
– Sou como as velas do altar
Que dão luz e vão morrendo.



António Botto
Portugal, Concavada 1897  
Brasil, Rio de Janeiro 1959
in Canções e outros poemas
Editor: Edições Quasi
photo by Goog

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