Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

23 de agosto de 2015

Joaquim Pessoa: Balada para uma mulher

Reparem quando ela passa.
Beija os filhos no olhar!
Esta palavra ternura
quem é que a soube inventar?

Lá vai ela. Como tem
os lábios cor de romã!
Ela vai. Mas quem bebeu
nos seus seios a manhã?

Tem ancas de sofrimento.
É simples como a pobreza.
Nos cabelos dorme o vento
com a palavra tristeza.

Lá vai ela. Minha dor.
Égua de prata a correr!
Vai a fingir que o amor
também se pode vender.

Lá vai. Lá vai. E que importa
a dor que me nasce a rodos?
Ela vai de porta em porta
vender um pouco de todos.

Ela vai. Como se fosse
minha irmã ou minha mãe.
É como o vinho mais doce
e mais amargo também.

Lá vai ela. Minha dor.
Égua de prata. Luar.
Vai a fingir que o amor
também se pode pagar.

Lá vai. Lá vai. E no peito
rompe uma flor de ciúme.
A raiva cresce no leito
entre lençóis de azedume.

Ela vai. É como a luta
de um homem contra a desgraça.
Chamem-lhe flor mãe ou puta
mas não riam quando passa.

Lá vai ela. Meu amor.
Égua de prata a morrer!
Vai a fingir que esta dor
também se pode esquecer.




Joaquim Pessoa
Portugal, Barreiro 1948
in 125 poemas – Antologia Poética
Editor: Litexa
photo by Google

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