Por fim choveu,
e nas águas dissolveu-se a amargura das coisas.
Atenta, ó companheira
de beleza enlouquecida pelo sol,
dispensadora da recusa taciturna:
as árvores ainda não brotaram,
as sementes do solo não germinam.
Ah! é preciso propiciar a terra,
para que as ervas rebentem e haja flores.
Escuta: praticaremos hoje mesmo o rito mágico,
e em teu ventre mais branco do que a lua ou do que o gesso
acordaremos o mistério da fecundação.
Teus seios permanecem neutros como as penhas de granito;
teu dorso é como as glebas sem consolo,
onde os fantasmas vegetais se estorcem lamentosos:
teu corpo é como a árvore sem frutos.
Ouve porém:
quando os raios de sol atravessarem ramos florescidos,
talhando estátuas de luz,
entre elas nascerá teu filho,
sobre as relvas odorantes:
e as pétalas receberão as abelhas,
e os frutos estarão maduros para o bico dos pássaros.
Unamo-nos sobre o solo,
para que a terra inveje nosso amor
e lhe venha o desejo das florações divinas,
sombreadas pelas nuvens sem tosquia:
em teu busto errarão minhas mãos,
generosas como a chuva.
Olha! já o louro ventre da manhã
começa a refletir-se pelas fontes:
e em teu regaço delicioso como as plumas,
neste aconchego saboroso como a noite e imenso como o sono,
esperarei até que a terra propiciada reverdeça.
Pericles Eugênio da Silva Ramos
Brasil, 1919-1992
in Antologia da Poesia Erótica Brasileira
Editor: Tinta da China
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