Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

4 de junho de 2022

Dante Milano: FARRA

 

O coisa foi no domingo ver as mulheres da zona
Estava safado da vida
Porque elas estavam vestidas quando deviam estar nuas
Pra se poder escolher sem ser enganado
mas porém tinha lá uma mulata
Parecia uma cabocla
Que ele viu há muito tempo
Numa fita de cinema
Se chamava Salamboa
Pras polacas pras francesas
Todas elas muito escrotas
Cuspia «chô bacalhau».
Ele queria era a ti
Laurinha de Itiguassu
Mulata de Catumbi
Baianinha-a-cururu
Bonita como ela só
Entrou na casa da dita
«Sempre te amando e desprezando as outras» (varsa)
Mas ela deu o desprezo
Parecia Araci Cortes
Estrela de S. José
Bancando a superior
Quando a mulata ficou nua no quarto iluminado
Parecia a vaca estrelada do presepe de natal
Ele ficou com vergonha
Há gente que tem vergonha da beleza
Pagou os 5$000
Saiu desacorçoado
E começou a andar à toa
Açulado por uma porção de mulheres que chamavam
A rua era um fonógrafo
Ajuntamento no café da esquina
Luzes trombones pandeiros vozes chocalhos
«Nunca mais um carinho meu tu terás»
Aquentava o choro na panela da noite fria
A zona do meretrício
Parecia o carnaval.




Dante Milano
Brasil, 1899-1991
photo by Google


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