Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

7 de março de 2012

Mãe! : Almada Negreiros

Mãe!
Vem ouvir a minha cabeça a contar histórias ricas que
ainda viajei! Traze tinta encarnada para escrever
estas coisas! Tinta cor de sangue, sangue!
Verdadeiro, encarnado!

Mãe! Passa a tua mão pela minha cabeça!

Eu ainda não fiz viagens a minha cabeça
não se lembra senão de viagens! Eu vou
viajar. Tenho sede! Eu prometo saber viajar.

Quando voltar é para subir os degraus da tua casa,
um por um.
Eu vou aprender de cor os degraus da nossa casa.
Depois venho sentar-me a teu lado. Tu a coseres
e eu a contar-te as minhas viagens, aquelas
que eu viajei, tão parecidas com as que não
viajei, escritas ambas com as mesmas palavras.
Mãe! ata as tuas mãos às minhas e dá um nó
cego muito apertado! Eu quero qualquer coisa
da nossa casa. Como a mesa. Eu também
quero um feitio que sirva exactamente
para a nossa casa, como a mesa.

Mãe! Passa  a tua mão pela minha cabeça!
Quando passas a tua mão na minha
cabeça é tudo tão verdade!

Almada Negreiros in Rosa do Mundo (2001 poemas para o futuro)
(Portugal 1893-1970)
Foto Google

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