Esposa! irmã! anjo! guia dum Destino
cujo curso ignora as estrelas! Tu, que
eu amei
tão tarde, para seres demasiado cedo
adorada
por mim ─ que só nos campos da
Imortalidade
devia o meu espírito ter-te venerado,
divina presença num lugar divino,
ou acompanhar-te, fielmente, sobre
esta terra,
sombra do teu ser, desde a sua origem.
Mas não como sucede agora, amor, se já
pressinto
que se fecharam as fontes do meu
próprio coração
com o fim de manterem puras e
brilhantes as suas ondas
para ti, porque nessas lágrimas
encontras a alegria.
Não somos, tu e eu, como notas de
música
que existem umas para as outras, embora
tão diferentes,
─ diferença sem dissonância, capaz de
gerar
aqueles sons tão suaves, que fazem
vibrar as almas
como folhas, ao estremecerem sob a
mesma brisa?
Tua sabedoria fala em mim, e ordena-me
que ilumine
os escolhos onde se destroçam os
grandes corações:
nunca, nunca me senti preso a essa
seita poderosa
que julga que cada um devia escolher
entre a multidão só uma amante ou um
amigo,
e todos os outros apesar da beleza e
sabedoria,
seriam votados a um frio esquecimento,
pois assim o decide
a nossa moral, e que seja essa a
penosa estrada
atravessada pelos cansados passos dos
tão pobres escravos
que seguem, entre os mortos, a caminho
do seu lar
pela larga, ampla, vereda do mundo, e
assim
presos a um só companheiro ─ inimigo e
invejoso talvez─,
fazem a mais triste e longa das
viagens.
À argila e ao ouro não se compara o
verdadeiro Amor,
porque dividi-lo não é torna-lo menos
poderoso.
O Amor é como o entendimento, que se
torna brilhante
ao contemplar múltiplas verdades; é
como a tua luz,
Imaginação!, que desde a terra e o
céu,
e das profundidades da fantasia
humana,
igual a mil prismas e espelhos, enche
o universo de gloriosos raios, e
destrói
o erro, esse réptil, com as inúmeras
setas solares
da própria luz que reverbera: ah! como
são estreitos
o coração que ama, o cérebro que
contempla,
a vida que se consome, o espírito que
gera
um único ser, uma só forma, e assim
edifica
um sepulcro para toda a sua
eternidade.
Excerto
Epipsychidion é uma palavra forjada
que significa
a união de duas almas.
Emilia Viviani, jovem italiana por
quem o autor se apaixonou
aquando da sua estada em Itália, foi a
inspiradora deste poema.
Percy
Bysshe Shelley
Reino
Unido 1792-1822
in
“ Poesia Romântica Inglesa
Byron,
Shelley, Keats)
Editor: Relógio D’agua
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