Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

2 de abril de 2014

Armando Silva Carvalho: Abandono-te todas as noites




                  

Abandono-te todas as noites,
Troco-te pelos outros,
Por mim
Ou pelo simples sono que sempre me enganou
Desde criança.


Deixo-te ficar tantas vezes à luz duma velha lua
De queixo retorcido e rainha das bruxas
E em lugares frequentados por cães que defecam
Com o mudo amor dos donos
Sigilosamente
À trela.


Não devias esperar.
Este amor não é feito de sangue, a minha alma não anda
                                                           nessa rua deserta,
Nem vai, pé ante pé, contemplar o teu rosto,
Deitar-se em seguida sobre o teu corpo gelado
E limpar-te os olhos do frio
De uma madrugada
Impudica.



Armando Silva Carvalho
Portugal (Óbidos) 1938
in O que foi passado a limpo, Obra Poética
Editor: Assirio & Alvim
photo by google

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