Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

9 de abril de 2014

Nuno Júdice: Guillem de la Tour





















Amou a mulher de um barbeiro de Milão. E raptou-a
e levou-a consigo para Como, amando-a mais do que
a tudo no mundo. E Acontece que ela morreu. e ele,
tendo enlouquecido de amor, convenceu-se de que ela
continuava viva: e todas as noites ia ao seu
túmulo, tirava o corpo e olhava o seu rosto, e
abraçava-a, e estreitava-a nos braços. E pedia-lhe
que ela falasse com ele, e que lhe disse-se se
estava morta ou viva. Mas a gente da terra soube
o que se passava. Então pegaram nele e puseram-no
fora da região. e ele andou de bruxo em bruxo,
pedindo que trouxessem de volta a sua amada. Um
dia, um velho patife fez-lhe esta partida: disse-lhe
que, rezando todos os dias os salmos e cento e
cinquenta pai-nossos, e dando esmola a sete pobres,
durante um ano, vê-la-ia de volta. O que ele fez;
mas ao fim do ano nada aconteceu. vendo isso,
entrou em desespero e, no fim de tudo, deixou-se morrer.



Nuno Júdice
Portugal (Mexilhoeira Grande, Algarve) 1949
in Obra Poética (1972-1985)
Editor: Quetzal Editores
photo by google

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