Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

7 de abril de 2014

Milton de Godoy Campos: Tua nudez vestia de manhãs os pássaros





Minhas mãos, rudes pastores
ávidas percorrem as suavíssimas colinas
                                           de tuas ancas.
Como fremes! Águas inquietas
teu corpo ondeias e o louro tufo,
pondo olores de jardins em meu rosto
se alteia como o peito das gaivotas.
Tuas coxas abrem-se, vibram, e a tua carne
                                                   que penetro
me cinge com cílicios e flamas.
Canções e sedas se rompem.
Quase desmaias, com ternura e ânsia
cravas o luar dos dentes em meus ombros.
Sangras. Sangra a madrugada que nos
                                encontra enlaçados.
Embriagada pela manhã a terra se embebe
no esperma do sol. E meu aljôfar escorre
                                              dentro de ti.
E arfo e grito ─ amor!
Estrelas nasceram em teus olhos e ao morrerem,
                                                              em breve,
deixarão sons de violetas em tuas pálpebras.
Silêncio. Silêncio de asas que pousaram.
Nossas pupilas, flores que caem, se apagam.


Milton de Godoy Campos
Brasil (São Paulo) 1927
in Antologia de Poetas Brasileiros
Seleção: Mariazinha Congílio
Universitária Editora

1 comentário:

Unknown disse...

Grande amigo e Pai. Quando ele, Milton, mostrou-se há vinte anos este poema, convulsionei-me em um choro de saudade por ela. Carlos Drummond -assim estava escrito no livreto- considerava este um dos poemas mais belos já escritos.
Milton era homem de grande perspicácia. Sabio. Acertivo. Vinicius, Quintana, Bandeira, Pound, T.S. Elliot, Holderlin, Stefan Zweig, Eric Axel Karfeldt, todos considerei pai. Mas tive um que me amou e me permitiu chama-lo: Pai.
Pai, te amo, onde quer que as nuvens o tenha levado.
Obrigado pela oportunidade rara.