Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

1 de fevereiro de 2012

Balada de Chang-Kan: Li Bai


Nesse tempo eu usava ainda os cabelos em franja
E brincava colhendo flores à entrada de minha casa.
Vieste num cavalo de bambu,
Troteando à minha volta e atirando-me ameixas verdes.
Vivíamos os dois numa aldeia, chamada Chang-Kan,
Duas crianças alegres e inocentes.

Quando aos catorze anos me tornei tua esposa,
era tão tímida, que não conseguia tirar os olhos do chão.
Mil vezes me chamas-te,
Mas nem uma única vez te consegui olhar.

Pouco a pouco, perdi a timidez.
Com quinze anos, desejei que as minhas cinzas
Se misturassem com as tuas,
Para sempre, sempre, sempre.
Por que subiria agora ao cimo da montanha?

Tinha dezasseis anos, quando partiste
Para a longínqua terra Ku-To-Yen,
Através da garganta de Chu-Tang,
E estiveste ausente durante cinco meses.
Os macacos do alto das árvores lançam um lamento doloroso.

Arrastavas os pés quando te foste
Cresce musgo, agora, sobre os traços dos teus pés,
Tão profundo que não se pode arrancar.
Antes do tempo, caem as folhas neste outono ventoso.
Pares de borboletas salpicam de amarelo o jardim ocidental.
Entristecem-me. A minha pele perde o tom rosado.

Se regressares através da garganta do Rio Azul´
Por favor, não te esqueças de me avisar.
Para que eu possa ir ao teu encontro.
Tal é a minha ânsia
De te abraçar, que não me metem medo o vento das areias,
Nem a distância.

Li Bai
(China 701-762)
Photo by Google

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