Se para o canto amor me infunde quanto
No coração incêndio, luz na rima,
Se como lima o peito, o verso lima,
Se dá qual morte à vida, vida ao canto.
Pintarei tão alegre, doce tanto
A pena, que me mata, e que me anima,
Que quem do meu tormento se lastima
Me deseje o pesar, me inveje o pranto.
Vossa efígie, gentil Márcia adorada,
Qual foi da vista ao peito transferida,
Será do peito ao verso trasladada:
E como vista em vós, em mim ouvida
Terá dobrado ser, vida dobrada,
Se a quem morte me dá, dar posso eu vida.
Jerónimo Baía
(Portugal 1620-1688)
in Os dias do Amor
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