Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

15 de novembro de 2011

Oiça vizinha: o melhor

 Oiça vizinha: o melhor
É combinarmos o modo
De acabar com este amor
Que me toma o tempo todo.

Passo os meus dias a vê-la
Bordar ao pé da sacada.
Não me tiro da janela,
Não leio, não faço nada...

O seu trabalho é mais brando,
Não lhe prende o pensamento.
Vai conversando, bordando
E acirrando o meu tormento...

O meu, não: abro um artigo
De lei, mas nunca o acabo,
Pois dou de cara consigo
E mando as leis ao diabo.

Ao diabo mando as leis
Com excepção de um artigo
O mil e cinquenta e seis...
Quer conhecê-lo? Eu lho digo:


"Casamento é um contrato
Perpétuo." Este adjectivo
Transmuda o mais lindo parto
No assunto mais repulsivo.

"Perpétuo!" Repare bem
Que artigo cheio de puas
Ainda se não fosse além
Duma semana ou duas...

Olhe tivesse eu mandato
De legislar e poria:
"Casamento é um contrato
Duma hora – até um dia..."

Mas não tenho. É pois melhor
Combinarmos algum modo
De acabar com este amor
Que me toma o tempo todo.

Augusto Gil
(Portugal 1873-1929)
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