Estando eu à janela na minha almofada,
Minha agulha de ouro meu dedal de prata;
Passa um cavaleiro, pedia pousada;
Meu pai lha negou: quanto me custava;
-"Já vem vindo a noite, e tão só a estrada...
Senhor pai não digam tal de nossa casa
Que a um cavaleiro que pede pousada
Se feche esta porta à noite cerrada".
Roguei e pedi muito lhe pesava!
Mas eu tanto fiz que por fim deixava.
Fui-lhe abrir a porta, muito contente entrava;
Ao lar o levei, logo se assentava.
Ás mãos lhe dei água, ele se lavava;
Pus-lhe uma toalha, nela se limpava.
Poucas as palavras, que mal me falava,
Mas eu sentia que ele me mirava.
Fui a erguer os olhos, mal se levantava,
Os seus lindos olhos na terra os pregava.
Fui-lhe por a ceia, muito bem ceava;
A cama lhe fiz, nela se deitava.
Dei-lhe as boas noites, não me replicava:
Tão má cortesia nunca a vi usada!
Lá pela meia-noite que eu sufocava,
Sinto que me levam com a boca tapada...
Levam-me a cavalo, levam-me abraçada,
Correndo, correndo sempre à desfilada.
Sem abrir os olhos vi quem me roubava;
Calei-me e chorei ele não falava.
Dali muito longe que me perguntava
Eu na minha terra como me chamava.
-"Chamavam-me Iria, Iria a fidalga;
Por aqui agora Iria, a cansada.
Andando, andando, toda a noite andava;
Lá por madrugada que me atentava...
Horas esquecidas comigo lutava;
Nem forças nem rogos, tudo lhe mancava
Tirou do alforge...ali me matava;
Abriu uma cova onde me enterrava.
No fim de sete anos passa o cavaleiro,
Uma linda ermida viu naquele outeiro.
-"Minha Santa Iria, meu amor primeiro,
Se me perdoares serei teu romeiro.
-"Perdoar não te hei-de, ladrão carniceiro,
Que me degolaste que nem um cordeiro".
Romance Tradicional Português
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