Carta de apresentação


O SECRETO MILAGRE DA POESIA

Sentimo-nos bem com seu contacto.
Disertamos sobre as suas maravilhas.
Auscultamos pequenas portas do seu mistério
e chegamos a perder-nos com prazer
no remoínho do seu interior.
Apercebemo-nos das suas fragilidades e manipulações.
Da sua extrema leveza.
Do silêncio de sangue e da sua banalização.

Excerto

in Rosa do Mundo

28 de abril de 2013

Estendo os braços para ti . Fernando Pessoa

Estendo os braços para ti...

A noite cai nas nossas mãos...
Nós éramos melhor que irmãos
Na outra vida que vivi.

Teus girassóis eram na alma...
Os teus tanques nos gestos teus...
Tu inclinavas-te p’ra Deus
E a noite era uma grande palma...

Perdi-te quando me encontrei...
Não quis a vida que me deram...
Nossos beijos de outrora eram
Segundo uma divina lei...

Aparecias entre véus...
Passavas entre o trigo e a tarde...
Inda no meu coração arde
O poente que nos dera Deus..

Deixa que eu peça a Deus por ti
Para que venhas algum dia
Quando a vida estiver vazia
E eu chore o muito que vivi.

Então talvez de entre palmeiras
Tua presença abra em flor
Caminharás no meu amor
Como uma brisa por bandeiras.

Água nas cascatas desfeitas
Do meu sorriso enternecido...
Serás o íntimo sentido
Das nossas horas mais perfeitas…

Lua subindo no horizonte
Da minha imagem de ti
A tua vida estrelas e
Tantas estrelas que em vão conte.

Em teu torno, halo misterioso,
Sete planetas com anéis...
Seguindo como  fiéis
O teu advento silencioso.

E a vida longe, como um belo
Manto deixado em desvario...
Nós indo p’ra o Castelo Esguio
E Deus saliente do Castelo.


Fernando Pessoa
(Portugal 1888-1935)
“in Poesia 1902-1917”
photo by Google

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